Por Rafael Scotton
Amplamente conhecidas e aconselhadas apenas como forma de proteção patrimonial, muitos empresários ainda não sabem que as holdings também são indicadas para outras várias situações, como, no caso deste artigo, evitar que situações pessoais dos sócios possam interferir diretamente no poder de voto dentro da empresa operacional.
A constituição de sociedades operacionais exclusivamente entre as pessoas físicas de pais e filhos, irmãos ou primos, ainda é algo extremamente comum. E isto, na maioria dos casos, ocorre com a distribuição igualitária do capital social para cada envolvido ou para cada “bloco familiar”. Dessa forma, as decisões sobre a empresa demandariam consenso entre os dois lados, já que não há a formação de uma maioria absoluta.
O que não se imagina, entretanto, é que essa composição societária pode gerar prejuízos extremos ao longo da sociedade. Em casos como esses, qualquer alteração na vida de um dos sócios poderá interferir diretamente no número de quotas e, por consequência, no poder de controle e tomada de decisões da outra família, o que seria amenizado se o quadro social fosse composto pelas chamadas holdings de participação.
Para tentar exemplificar os riscos, imagine-se uma sociedade limitada formada na pessoa física de dois primos (blocos familiares distintos), cada um com 50% das quotas, ambos sócios administradores e com boa relação pessoal. Com o passar dos anos, o negócio começa a despontar, mas a relação entre os sócios se torna conflituosa, com um querendo “mandar” mais na empresa do que o outro e sem que nenhum deles se disponha a deixar o negócio.
Um dos primos, então, tem as quotas penhoradas por dívidas pessoais, na proporção de 25% do capital social da empresa, o que autoriza a compra desse percentual pelo outro ramo familiar (art. 861, II, CPC). Esse percentual também ilustra o que pode ocorrer em casos de divórcio, em que o ex-cônjuge pleiteia quotas pela meação, ou seja, a parte que cabe a ele sobre os bens que integravam o patrimônio do casal.
Assim, seja adquirindo as quotas do credor ou aliciando os votos do ex-cônjuge, o ramo familiar contrário passa a ter maioria no controle acionário, podendo votar e aprovar a destituição do outro sócio da administração da empresa, o aumento de pró-labore e outras importantes deliberações. Ou seja, o outro bloco familiar e todos os seus dependentes arcam com as consequências de um eventual divórcio, dívidas do sócio, entre outras hipóteses.
Esses reflexos, no entanto, poderiam ter rumo diferente se as participações societárias de cada um dos envolvidos fossem geridas através de holdings. Nesse caso, obrigatoriamente, haveria um intermediário nos conflitos daquele ramo familiar, pois os credores ou o ex-cônjuge teriam participação apenas na holding, distanciando a pessoa física da empresa.
Com isso, todo e qualquer conflito ou reflexo societário existente teria que ser decidido primeiro dentro da holding de participação, de acordo com a forma de direitos e obrigações estipuladas no contrato social. E isso ocorreria sem que a sociedade operacional e/ou o bloco familiar fossem diretamente prejudicados.
Nesse caso, a holding busca afastar a possibilidade de ingerência individual do sócio minoritário diretamente na operação, assegurando a manutenção do controle societário e do poder de voto de cada grupo familiar, justificando, assim, sua implementação.
No entanto, apesar das vantagens acima comentadas, é necessário cautela e planejamento para celebrar a reorganização societária nesses moldes, já que há grande possibilidade de aumento da carga tributária e dos custos da operação. Os detalhes sobre isso, por sua vez, ficam para uma próxima postagem.
Leia mais artigos e publicações com Rafael Scotton.