Em meio aos prejuízos ocasionados pelo perdimento da carga surgem dúvidas quanto à cobrança dos custos de armazenagem. Mesmo tendo a mercadoria confiscada, o importador precisa arcar com as despesas no recinto alfandegado. Por lei, os valores são devidos pelo responsável até que a pena de perdimento seja decretada pela autoridade administrativa.
De acordo com o advogado Rafael Scotton, isso pode ocorrer de duas maneiras. Uma delas é se o despacho aduaneiro ainda não tiver sido iniciado. Já o outro modo é aplicado quando os procedimentos junto à Alfândega estiverem em curso. Essas situações distintas refletem diretamente no prazo de duração da responsabilidade pelo pagamento por parte do importador.
Se o processo ainda não estiver em curso, o pagamento pela armazenagem variará de 45 a 90 dias. Conforme Scotton, esse prazo dependerá do modo como ocorreu o perdimento ou abandono, seguindo os termos dos artigos 642 e 644 do Decreto nº 6.759/2009. “Nesses casos, a decretação do perdimento ocorre de ofício pela Administração Pública. Assim, todo o período que exceder ao disposto nas hipóteses dos referidos artigos passa a ser automaticamente de responsabilidade da União”, aponta o advogado.
Despacho aduaneiro em curso
Contudo, se os procedimentos de despacho aduaneiro estiverem em andamento, a situação passa a ser diferente. O assunto, segundo o advogado, é, inclusive, objeto de discussão junto ao Judiciário, pois não existe prazo determinado em lei para que a fiscalização da mercadoria e despacho da carga encerrem. “Ou seja, o processo de desembaraço pode se arrastar por período bem superior aos 90 dias estipulados para os casos de perdimento de ofício, ou mesmo dos 180 dias do prazo estabelecido para o canal cinza, até que se tenha a liberação ou a decretação da pena de perdimento, motivando as diversas discussões judiciais sobre a responsabilidade quanto aos custos de armazenagem nesses casos”, detalha Scotton.
Na maioria das decisões judiciais, a responsabilidade é do importador até o encerramento da análise. Isso ocorre mesmo que ultrapasse os 90 dias indicados para o perdimento automático. Porém, de acordo com Scotton, esse posicionamento é ponto de divergência. “Isso porque, apesar de não existir prazo determinado para o desembaraço, os processos administrativos devem ter duração razoável (art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição). Esse ponto, em especial, ganha extrema relevância quando há flagrante prejuízo ao importador pela inércia da aduana em dar andamento ao processo, na medida em que os custos de armazenagem aumentam a cada dia e não há certeza quanto ao custo total da operação, muitas vezes planejada com meses de antecedência”, explica o advogado.
Impulsionamento de processos administrativos
Em relação à morosidade, segundo ele, há algumas formas de tentar minimizar prejuízos. Uma delas é o importador impulsionar judicialmente os processos administrativos que estão regularizados e sem movimentações pela Administração Pública em até oito dias. “Dessa forma, ainda que as mercadorias destinadas ao canal cinza possam permanecer em fiscalização por até 180 dias, não significa que o processo deve demorar tal período ou que a fiscalização possa ficar completamente inerte nesse intervalo, estando autorizado o importador a ingressar com a medida judicial competente para garantir o caminho adequado do despacho aduaneiro”, observa o advogado.
Na avaliação do profissional, mesmo que o importador abandone a carga após o início do despacho, o perdimento deveria ser considerado até a data limite de fiscalização pelo canal cinza.
Exceções não são descartadas
Porém, apesar da regra apontar que a armazenagem deve ser paga mesmo com perdimento, podem ocorrer exceções. Por se tratar da prestação de um serviço de cunho privado pelo terminal de cargas, a depender da relação entre importador e terminal, os operadores do recinto alfandegado podem optar por não realizar essa cobrança ou conceder descontos. Um exemplo em que essa situação pode ser aplicada é quando apenas uma parte da carga é confiscada pela Receita Federal.
Restituição de tributos
Outro ponto que pode ajudar a minimizar prejuízos se a carga for confiscada está relacionado aos impostos. “Em alguns casos em que houve a aplicação da pena de perdimento da mercadoria, determinados tributos eventualmente antecipados pelo importador, como o PIS/Importação e a Cofins/Importação, podem ser restituídos, pois não há configuração do fato gerador”, assinala Scotton.
O próprio Regulamento Aduaneiro (Decreto n° 6.759/2009), no artigo 71, menciona a relação entre imposto de importação e a pena de perdimento. Conforme o texto, em regra, o tributo não incide sobre a mercadoria estrangeira que for confiscada. As exceções ocorrem quando as cargas não são localizadas pelas autoridades ou quando os produtos tiverem sido consumidos ou revendidos.
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