O Encontro Econômico Brasil-Alemanha (EEBA) é um ritual anual que serve para representantes do governo, empresariado e federações de ambos os países reafirmarem quão harmoniosas são suas relações. Mas desta vez foi diferente: pairava no ar um nervosismo palpável na abertura da 38ª conferência econômica, realizada neste ano em Natal-RN.
“Raramente houve tantas tensões nas relações entre os dois Estados quanto agora”, comentou Ingo Plöger, presidente do Conselho Empresarial da América Latina (CEAL), “Isso dificulta a cooperação.”
Se por um lado Alemanha e Brasil nunca cooperaram de forma tão próxima na economia, na política suas diferenças aumentaram. Desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, em janeiro, o país vivencia uma guinada à direita, com a defesa de políticas – relativas a meio ambiente, minorias, floresta tropical, clima e direitos humanos – que na Alemanha só contam com a aprovação de uma minoria. Bolsonaro é criticado em toda a União Europeia por causa dos incêndios na Amazônia, por exemplo.
Ao mesmo tempo, contudo, o país se tornou mais importante para a política externa e econômica alemã desde que a UE e o Mercosul (integrado também pela Argentina, Paraguai e Uruguai) conseguiram fechar um acordo de livre-comércio após 20 anos de negociações. Além do mais, realizam-se reformas econômicas no Brasil, pela primeira vez após muitos anos: o país se abre para comércio e investimentos, e várias empresas estão sendo privatizadas.
Em Natal, os representantes de ambos os governos se esforçavam visivelmente para manter a harmonia. Repetidamente assegurava-se que era preciso dialogar, e não falar uns sobre os outros. Entretanto não se deixou passar nenhuma oportunidade para lembrar que a ampliação do comércio e investimentos não pode ocorrer à custa dos aspectos social ou ambiental.
Dominava o temor de que a ratificação do acordo UE-Mercosul, alcançado a duras penas, possa agora se prolongar significativamente, devido à resistência crescente na Europa. “Devemos fazer de tudo para que o acordo seja implementado”, instou Dieter Kempf, da Confederação da Indústria Alemã (BDI).
O embaixador alemão em Brasília, Georg Witschel, igualmente alertou contra colocar-se o pacto de livre-comércio em perigo, por leviandade. Seu homólogo em Berlim, Roberto Jaguaribe, aconselhou em especial os brasileiros a não deixarem escapar mais uma oportunidade.
A indústria alemã teme ficar para trás no Brasil. Os investimentos das empresas alemãs minguaram nos últimos anos; entre os investidores estrangeiros, a Alemanha ocupa apenas o nono lugar: os Estados Unidos e a China a ultrapassaram.
Diante das reformas econômicas no Brasil, Andreas Renschler, presidente do Conselho da Indústria para a América Latina (LADW), aconselha que se amplie a parceria estratégica teuto-brasileira no sentido da digitalização e sustentabilidade.
“Para as pequenas e médias empresas, este seria um passo importante para que invistam no Brasil”, confirmou Thomas Bareiss, secretário parlamentar de Estado no Ministério alemão da Economia.
Os participantes do EEBA ficaram aliviados quando o vice-presidente brasileiro, Hamilton Mourão, esboçou uma análise equilibrada e objetiva da relação entre os dois países. O general da reserva vê o Brasil numa profunda crise e quer elevar a baixa produção nacional por meio de reformas e abertura de mercados. Ao declarar que é responsabilidade brasileira proteger a Amazônia, ele foi aplaudido: há um bom tempo não se escutava esse tipo de discurso partindo de Brasília.
Em contrapartida, a participação do deputado federal Eduardo Bolsonaro levou os presentes de volta à realidade política do Brasil. O terceiro filho do presidente – que este pretende nomear embaixador nos EUA – participou formalmente do EEBA como presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara. No fim das contas, porém, tratou-se acima de tudo de uma apresentação em interesse próprio, a fim de se promover como candidato ao posto em Washington.
Eduardo explicou que sua meta prioritária é um acordo de livre-comércio com os EUA. Por outro lado, disse ter grande respeito pelos fabricantes de automóveis alemães, e principalmente para com os produtores de aço: “A Alemanha é quem fabrica as melhores pistolas”, disse.